Às vezes preciso escrever pra
organizar as ideias.
Começo essa reflexão escrita com
a intenção de esclarecer, especialmente para eu mesmo, a seguinte questão:
porque sinto repulsa por Comparações Trágicas? (aquelas que apontam situações
de extrema dor como meio para deslegitimizar outros questionamentos).
É possível que não encontre a
resposta, restando-me apenas admitir a imaturidade, frieza, recalque ou qualquer
coisa que os valha. Na verdade, se não conseguir racionalizar essa repulsa,
terei de abandoná-la.
Assim, inicio a jornada com a
definição do vocábulo catarse:
Catarse (ss). [Do Gr. Kátharsis] 3. Psicol/Teatr. Efeito moral e purificador
da tragédia clássica, cujas situações dramáticas de extrema intensidade e
violência, trazem a tona o sentimento de terror e piedade dos espectadores,
proporcionando-lhes o alívio, ou a purgação desses sentimentos.
Recorro ao dicionário pois julgo
a filologia e o estudo das palavras como essenciais na compreensão do modo como
entendemos o mundo, uma vez que são exatamente elas, as palavras, o berço da
busca por, de certa forma e tanto quanto possível, arquetipar os sentimentos.
O princípio das Comparações Trágicas
é exatamente esse: o da catarse forçada.
Quem és tu pra questionar algo
quando existe a Criança da África, os Escravos Modernos na China, os
Deficientes. Agradece a Deus por não vos ter feito à semelhança nem de um, nem
de outro, amém. A Comparação Trágica, no entanto, não tem resultado se não o de
expurgar e exorcizar qualquer dilema através de parábolas que levam à culpa e,
portanto, ao autoflagelo redentor, porém estéril. (qualquer semelhança com a
culpa da cruz não é mera coincidência.)
A Comparação Trágica usa da
compaixão e da empatia do homem para induzir ao consentimento de um suposto crime,
o pecado de pensar e questionar a vida, e assim reduz qualquer inquietação ao
supérfluo.
A empatia e a compaixão são
sentimentos que surgem a partir da existência e identificação com o outro, não
existe empatia sem o reconhecimento do diferente/igual no outro (não pergunte
por quem os sinos dobram; eles dobram por ti). Já a inquietude, prefiro chamar
de “insustentável leveza”, corresponde apenas ao indivíduo. Desta forma, questionar
a vida e a sociedade não se opõe, em nenhuma instância, ao “compadecer-se do
próximo”, confirmando a falácia da Comparação Trágica. É afinal nela que mora o
verdadeiro egoísmo, uma vez que se baseia na gratidão de “ser diferente
daqueles infelizes”.